terça-feira, 21 de julho de 2015

A biografia mental da direita brasileira

A democracia é o regime dos homens aborrecidos. Também é coisa de velho. Por que nós a queremos? Para mantê-la.
O Brasil insiste em ser a exceção. A elite intelectual e a imprensa não sabem ou fingem não saber –pouco importa se é burrice ou má-fé– a diferença entre direita democrática e extrema direita. Sufocam o debate com sua ignorância bem-intencionada, com sua má-fé ignorante e, às vezes, até com seu humor iletrado.
Extrema-esquerda e esquerda divergem nos métodos, não na ambição de subordinar a sociedade a um ente de razão eles claro, que, num primeiro momento, a domine e, depois, a substitua, pouco importando se pensam num partido ou num conselho de sábios. Já a extrema direita é o avesso da direita democrática; a diferença é de essência, não de grau, como já demonstrou Olavo de Carvalho. Isso é história, não opinião. Procurem os respectivos manifestos dos vários fascismos do século passado. Seu verdadeiro inimigo é o liberalismo, não o comunismo, no qual os fascistas sempre reconheceram serem aliados… “Direita”, no entanto, virou palavrão no Brasil. Na academia, o liberalismo é tratado como sinônimo de exclusão social.
Nas últimas três décadas consagrou-se um princípio que se tornou um axioma da política brasileira: “A virtude está à esquerda”. Tornou-se um axioma porque foi subscrito por lideranças que desejavam lustrar a sua imagem com uma marca da esquerda e por ter sido, silenciosa e progressivamente, subscrito pelos eleitores em geral.
Os corolários do axioma são visíveis por todo lado: desde a recuperação da guerra fria num mundo sem guerra fria, a forma peculiar de entendimento dos direitos humanos e a maneira tolerante de encarar as questões da segurança pública até a aberta relativização da lei e da Constituição. Plasmou-se, então, uma retórica política e ideologicamente comprometida, na qual o uso ou não uso da palavra presidente no feminino já indica a posição política de quem fala, o termo privatização é substituído por concessão e a corrupção, pelo mais ameno conceito de malfeito.
Por que esse princípio logrou implantar-se como um axioma na nossa cultura política? 1) O fim do regime de 1964, da forma como ocorreu, deslegitimou os partidos de direita e conservadores; 2) a legitimidade do novo regime democrático concentrou-se no espaço da esquerda do espectro político; 3) os demais partidos (centro e centro-esquerda) foram submetidos a uma “demonização em camadas”, que os empurrava para a direita
O PT, já nessa época um partido forte, assumiu e liderou a demonização, centrada na figura dos líderes do PSDB (Covas, FHC, Serra todos da esquerda fabiana, os mesmos que apoiavam candidatos do PT em segundo turno nas disputas contra Maluf), na condenação do Plano Real e na acusação de neoliberalismo, privatizações, submissão ao mercado e ao capitalismo internacional.
O PT chega ao poder – Uma vez lá, sem mais rivais à esquerda e tendo o domínio do Estado ( os nossos impostos), o PT deu uma guinada enérgica para o centro e centro-direita, cooptou partidos e lideranças de direita, até o extremo da visita ao jardim de Maluf. A ideologia ficou restrita às relações exteriores, o marketing tornou-se permanente e o populismo – aquela luva esquerda calçada numa mão direita – subalternizou e descaracterizou o compromisso ideológico em troca da manutenção do poder a qualquer preço.
Na realidade, vivemos a reiteração do movimento pendular que caracteriza o sistema político brasileiro ao longo de sua história. Um pêndulo que oscila entre esquerda e direita, Estado e sociedade, autoritarismo e liberdade, centralização e descentralização, nacionalismo populista e abertura para o mercado, liberdade beirando anarquia e ditadura.

Com teses de esquerda legitimando o sistema político, a direita sujeita às sucessivas demonizações e o centro sempre ameaçado de ser denunciado como a nova face da direita (vide PSDB), as defesas “orgânicas” de uma democracia representativa perderam grande parte do seu poder de imunização e o axioma “a virtude está à esquerda” reinou incontestado pelos últimos 30 anos. Pior para o Brasil

                                                                              
                                                                          

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