terça-feira, 18 de dezembro de 2018

Tudo o que você gostaria de saber sobre a direita e continuará não sabendo.

O leitor sabe quem são von Mises, Hayek, Rothbard, Kirk, Muggeridge, Horowitz, Sowell, Babbit, Scruton, Peyrefitte, Jouvenel, Voegelin, Guénon, Nasr, Schuon, Lindblom, Rosenstock-Huessy, Rosenzweig, Kristol? Se perguntar a um direitista culto, ele lhe dirá: São os principais pensadores de direita do século XX. Mas, se procurar os seus nomes na lista de verbetes deste “Dicionário Crítico do Pensamento de Direita”, não os encontrará. Em lugar deles, topará com uma lista de tarados, psicopatas, esquisitões, assassinos e genocidas — de Röhm a Eichmann –, muitos deles de identidade ideológica incerta, além de autores de terceira ordem e personagens de importância episódica. De escritores significativos, só os mais enfezados e atípicos, como Charles Maurras, que terminou excomungado por um papa conservador, e Ezra Pound, cujos escritos políticos ninguém leu e que o próprio autor do verbete só conhece por referência indireta. Dos direitistas normais sobraram apenas Ortega, Pareto, Schmitt, Michels, Mosca, Heidegger, Gentile e Burke, além de alguns brasileiros. Em compensação, há verbetes sobre Walt Disney, cuja única contribuição ao “pensamento de direita” foi delatar uns agentes comunistas, sobre Eleonora Duse, da qual só não se pode dizer que não deu nada porque foi amante de um direitista, e sobre Monica Lewinsky, que para a direita só deu assunto.
Se você quer saber o que é a direita, não há de ser aqui que vai obter uma resposta. Mas, se quer saber o que a esquerda deseja que você imagine que a direita é, então, amigo, este é o livro para você. Devore estas páginas em que 120 professores torraram o melhor de seus neurônios e uma substancial verba de pesquisa, e sairá ignorando tudo o que é preciso ignorar para passar de ano na escolinha de militantes em que se transformou a universidade brasileira.
É verdade que o Dicionário começa com uma introdução onde o organizador mostra não ignorar o assunto de todo. Mas, se ele sabe o que é conservadorismo, então por que permite tanto esforço, no resto do livro, para confundi-lo com fascismo e nazismo, que tiveram contra si as mais poderosas forças conservadoras da modernidade, o “establishment” norte-americano e o Império Britânico? De 282 verbetes, 67 são sobre nazismo — a quarta parte do livro, sem uma menção sequer ao fato de que eminentes conservadores julgam o nazismo um movimento de esquerda. Especialmente útil para consolidar a noção falsa é a profusão de verbetes sobre anti-semitismo, todos omitindo que esse fenômeno nada tem de essencialmente direitista, já que endossado por Karl Marx e praticado abundantemente na URSS.
Um “dicionário do pensamento de esquerda” que, omitindo a maioria dos autores essenciais, ao mesmo tempo enfatizasse os cem milhões de mortos, o Gulag, os Processos de Moscou e o trabalho escravo que construiu as economias da URSS e da China, mesmo sem faltar com a verdade nos detalhes, seria considerado pura propaganda direitista e não mereceria comentário. Mas este é propaganda enganosa, que atribui à direita pecados notórios da esquerda, como por exemplo a política racial norte-americana que fortalece as identidades dos grupos separados, incentivando o orgulho e a divisão.
As 460 páginas do livro, divididas pelo número de autores, resultam em menos de quatro para cada um, seguidas de indicações bibliográficas que raramente ultrapassam o total de cinco títulos e quase nunca se reportam a textos originais. Não obstante, o organizador proclama que redigi-las custou quatro anos de trabalho e não poderia ter sido feito sem o auxílio financeiro de três instituições patrocinadoras. Espero, pelo bem da reputação intelectual da equipe, que isso não seja verdade.
O que não se pode negar é que se trata de obra original: este é, nos anais da história editorial, o primeiro livro dedicado a um dos autores que o subscrevem.
Brilhante como sempre Olavo de Carvalho.

quarta-feira, 28 de novembro de 2018

Histórico de uma destruição econômica anunciada.

A institucionalização das incertezas políticas e econômicas no Brasil foi iniciada pelo governo Dilma. Tudo começou quando seu governo, em novembro de 2012, decidiu unilateralmente revogar os contratos de concessão das empresas de geração e transmissão de energia (os quais terminariam entre 2014 e 2018) com o intuito de fazer novos contratos e impor tarifas menores.
A partir daquele momento, o governo deixava claro que não respeitava contratos.
A situação se intensificou quando o governo optou por fazer concessões de aeroportos e poços de petróleo seguindo um modelo que tabelava o lucro permitido e impunha regulamentações esdrúxulas.  Os grandes investidores não se interessaram.
A adoção de tarifas de importação — as quais tornaram o Brasil o país mais fechado do mundo — com o intuito de incentivar alguns setores escolhidos segundo critérios políticos não apenas não ajudou em nada, como ainda piorou a vida de empreendedores dependentes de insumos importados.
aparelhamento das estatais e o uso do BNDES para a escolha de campeãs nacionais (o que agravou a situação das contas do governo) deteriorou ainda mais a confiança nas instituições.
A adoção de uma política econômica totalmente heterodoxa, sem um único histórico de êxito ao redor do mundo, comprovou que o governo era comandado por comediantes sádicos.
leniência para com a inflação, a maquiagem das contas públicas e os crescentes déficits orçamentários do governo — que geram a perspectiva de aumentos de impostos no futuro — só fizeram piorar o ambiente de negócios no Brasil.
E tudo isso foi intensificado pela crise política — sobre a qual já é possível escrever uma enciclopédia, tamanhos seus desdobramentos e surpresas — iniciada em 2015 e intensificada em 2016.
O fato é que, desde o final de 2012, a única certeza que se tem no Brasil é que até mesmo o curto prazo é completamente imprevisível. E, em 2016, tal imprevisibilidade foi levada ao paroxismo: a destituição de uma presidente, as prisões de políticos e empreiteiros, a condução coercitiva de um ex-presidente, a queda de vários ministros, a ascensão de suplentes espalhafatosos à presidência da Câmara, procuradores que adoram holofotes, integrantes do Supremo que adoram aparecer e brigar entre si, e um Senado comandado por um réu.
Pautas e reformas econômicas que avançam sob o comando de um deputado ou senador são interrompidas e até mesmo revertidas quando este é derrubado e substituído por outro, normalmente um opositor.
Hoje, não se sabe se o atual presidente terminará o mandato-tampão ou se será preso antes disso. Se sua equipe econômica será mantida ou será trocada por uma mais desenvolvimentista. Para piorar, as opções presidenciais para 2018 ou estão enroladas na Lava-Jato ou são populistas de extrema-esquerda.
O que não falta ao Brasil, portanto, é emoção. Só que essa emoção gera consequências trágicas sobre a economia.
Sem luz no fim do túnel
A economia brasileira está encolhendo há 10 trimestres seguidos. A última vez que houve algum crescimento foi no primeiro trimestre de 2014 em relação ao primeiro trimestre de 2013.
O principal causador dessa contração econômica tem sido a queda — aliás, queda não; desabamento — dos investimentos. É sempre importante ressaltar que os investimentos são a variável mais importante do PIB porque são eles que indicam a saúde atual da economia e permitem que a situação futura seja melhor.
Analisando o que houve com os investimentos em máquinas, equipamentos, instalações industriais e comerciais, e infraestrutura no Brasil, o quadro é desolador. Só nos últimos 4 trimestres, os investimentos encolheram nada menos que 13,5%.
O gráfico a seguir mostra que esses investimentos (formação bruta de capital fixo) despencaram e regrediram a níveis de meados de 2009.

Evolução da formação bruta de capital fixo
Observe que os investimentos pararam de crescer no segundo trimestre de 2013, muito provavelmente por causa das inquietações trazidas pelas manifestações de junho daquele ano. De lá para cá, com a intensificação de todas aquelas incertezas listadas no início do artigo, os investimentos já encolheram nada menos que 29%.
Não há crescimento econômico sem investimentos. Não há empregos sem investimentos.
Investimentos — nacionais e estrangeiros — só ocorrem quando o ambiente econômico e político do país é propício. Se o ambiente econômico e político for seguidamente vituperado pelo estado, não há investimento.
Empreendedores são, por definição, indivíduos que gostam de se arriscar. Quando empreendedores talentosos de todos os cantos do globo decidem investir em um país, eles estão correndo riscos e esperam enriquecer em decorrência disso. No entanto, se o preço a ser pago — além dos impostos altos e da complexa burocracia — são as incertezas políticas, as exigência de propinas, o desrespeito a contratos, a insegurança jurídica, a moeda instável, e os déficits orçamentários (que aumentam as incertezas futuras e elevam os juros dos empréstimos), esses empreendedores serão desestimulados e seus vários investimentos não ocorrerão.
E aí não haverá nem crescimento econômico nem criação de empregos. Os atuais 12 milhões de desempregados estão vivenciando essa consequência de maneira intensa.
Incerteza gerada pelo regime
Essa questão da confiança, da previsibilidade e das expectativas (positivas ou negativas) geradas por um governo é tão essencial, que os economistas seguidores da Escola Austríaca cunharam o termo "Incerteza Gerada pelo Regime" para explicar como o governo pode destruir uma economia — afugentando investimentos produtivos — ao simplesmente gerar incertezas políticas e jurídicas.
Um dos principais motores do investimento é a confiança: poupadores, investidores e empreendedores arriscam seu capital porque esperam obter um retorno. Mas se o estado cria um ambiente de incerteza econômica e institucional, fazendo com que não haja nenhuma confiança de que este possível retorno seja realmente alcançável, então os investimentos simplesmente não ocorrem. Quem vai ser louco de se arriscar?
Quando a confiança na estabilidade e na previsibilidade do cenário político, jurídico e institucional se esvai, os investimentos de longo prazo desabam. E com ele vão juntos os empregos, os salários, o bem-estar e a economia como um todo.
Para o Brasil voltar a crescer, é necessário retomar os investimentos. E para que os investimentos voltem é necessário haver um clima de estabilidade, confiança e flexibilidade. Mas a 'incerteza de regime' criada pelos políticos brasileiros não só vem destruindo a economia, como tudo ainda aponta para a continuidade deste processo.
Conclusão
O governo não pode enriquecer as pessoas, mas pode perfeitamente empobrecê-las. E uma das formas mais eficazes de empobrecer a população é criando um ambiente político turbulento e instável, em conjunto com um marco institucional imprevisível, arbitrário, repleto de intervenções, corrupção, privilégios e protecionismos.
Necessitamos, com urgência, de novas empresas e novos setores econômicos. Mas ambos só podem ser criados com um volume crescente de investimentos. Só que os investimentos não só não estão crescendo, como, pavor dos pavores, estão se contraindo. Desgraçadamente, se a roda empreendedorial pára de girar, como já parou no Brasil, todo o nosso dinamismo futuro entra em risco.
O crescimento econômico não é algo automático. Neste contexto global cada vez mais incerto, é absolutamente crucial restituir um mínimo de confiança e credibilidade na economia brasileira, tornando-a atraente para empreendedores de todos os cantos do mundo. Caso contrário, a economia seguirá afundando, fazendo com que inquietações civis e distúrbios violentos — principalmente nas grandes cidades — se tornem um futuro possível.
Por tudo isso, é hora de completar o ajuste fiscal para estancar o déficit — a aprovação da PEC do Teto é um passo inicial nessa direção —, e reduzir os impostos. A redução de impostos implica necessariamente o corte de gastos e a consequente redução drástica do estado e de sua burocracia, a qual impede o desenvolvimento econômico e garante nababescos privilégios aos seus integrantes à custa da população que trabalha e produz.
Acima de tudo, é crucial liberalizar amplamente nossos setores produtivos, facilitando ao máximo o empreendedorismo (sem o qual não há empregos nem salários). Igualmente importante é acabar com a participação do estado na economia, desestatizando estatais e abolindo os conluios corporativistas entre estado e grandes empresas, que tantas desgraças trouxeram ao país.
Com estado grande, intervencionista e ultra-regulador, lobbies, grupos de interesse, propinas e subornos empresariais sempre serão a regra. Não há como reduzir a corrupção e os privilégios sem se reduzir o estado.
Para a economia voltar a crescer, os políticos e o estado brasileiro terão de encolher.
Todo o nosso futuro depende disso. Ou então podemos ir fazer companhia à Venezuela.
                                                                     

sexta-feira, 29 de setembro de 2017

Para aqueles que são contrários a Reforma da Previdência

Um dos principais argumentos daqueles que se colocam contra a reforma da previdência é o de que a cobrança dos devedores já seria suficiente para cobrir o rombo existente. Dessa forma, não seria o trabalhador, mais uma vez, que precisaria pagar a conta deste imenso déficit. Verdade? Não! Este é mais um dos argumentos que estamos desmistificando ao longo de uma série de artigos.
A dívida previdenciária, atualmente, é de R$ 433 bilhões. O rombo da previdência em 2017 será aproximadamente R$ 189 bilhões e de R$ 202 bilhões em 2018. Ou seja, mesmo que fosse paga toda essa dívida, o problema seria resolvido por no máximo dois anos. Uma vez feita a cobrança da dívida, não haveria mais recursos para cobrir os déficits dos anos seguintes, que continuaria existindo.
Mas este cenário de cobrança total da dívida também não existe. A realidade é ainda pior. Dos R$ 433 bilhões em dívida ativa previdenciária, R$ 251 bilhões são de baixíssima recuperação, ou seja, de empresas falidas ou sem patrimônio. É como cobrar algo de uma pessoa que perdeu o emprego ou não tem nenhum bem material.
Sobram, portanto, R$ 182 bilhões passíveis de recuperação. Desse restante, R$ 52 bilhões já estão sendo de fato pagos. Os outros 130 bilhões estão em cobrança com potencial de recuperação. Dessa forma, mesmo que esse valor fosse recuperado automaticamente, não cobriria sequer o déficit previsto para este ano de 2017, que é de R$ 189 bilhões.
Outro argumento é que o Governo sequer cobra os devedores da previdência. Como já falado, R$ 52 bilhões já estão sendo de fato pagos e 130 bilhões estão em cobrança. A grande questão é que a cobrança leva tempo, pois segue os procedimentos necessários. Há um custo elevado para que a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) promova execuções fiscais. O tempo de recuperação das dívidas médio é de quase 10 anos e chance de recuperação do valor integral de 25%, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).
Além disso, a PGFN – órgão responsável por representar o governo na cobrança de suas dívidas – tem aperfeiçoado seus mecanismos e estratégias de cobrança, para elevar o percentual recuperado. Recentemente, houve a criação de um mecanismo para publicar na internet a lista de devedores. A publicação expõe o devedor, que passa a ter maior interesse de sair dessa lista negativa, além de incentivar o controle social.
Há grandes empresas que não pagam o que devem à previdência, isso é verdade. Parte dos débitos das empresas em atividade, porém, ou já foi renegociado e parcelado ou decorre de discussão judicial. A cobrança da dívida é importante e está sendo feita, mas não elimina a necessidade de reforma. Mesmo que toda a dívida cobrada fosse recuperada, isso não resolveria o desequilíbrio nas contas da previdência. É como querer vender um carro para pagar as contas de alguém que vive se endividando: resolve por um tempo apenas, mas o problema continua lá.
                                                                       

terça-feira, 8 de agosto de 2017

Brasil no capitalismo do povo

                                                                   Resultado de imagem para Capitalismo popular  



Brasil no capitalismo do povo com a transferência do controle das 154 estatais federais ao povo. 

O programa de “repartição do capital” inauguraria imediatamente o capitalismo do povo. O programa de “desestatização” aumentaria gradualmente a eficiência de gestão, além de trazer receitas, que o Governo utilizaria para sanar aflitivas carências básicas – analfabetismo, endemias e epidemias, desnutrição e insuficiência dos serviços básicos de infraestrutura. Não faz sentido o governo ter postos de gasolina quando não tem postos de saúde, ou competir na fabricação de computadores quando não tem dinheiro para cuidar da malária... 

154 Empresas Estatais Federais Dependentes Não Dependentes
Empresas com Controle Direto da União - 48
Empresas com Controle Indireto da União - 106
Empresas Estatais Dependentes do Tesouro Nacional - 18
Empresas Estatais Não Dependentes do Tesouro Nacional - 136
Empresas Estatais Não Dependentes com Controle Direto da União - 30
Empresas Estatais Não Dependentes com Controle Indireto da União – 106


Para o começo de conversa precisamos de uma revolução semântica. A expressão “setor privado” inspira uma conotação de egoísmo e apropriação. A expressão “setor público” transmite a ideia de generosidade. Isso é injusto e inadequado. Mais correto seria, como sugere o economista paulista Rafael Vechiatti, chamarmos o setor público de “setor coercitivo”, e o privado de “setor voluntário”.

Sempre que se fala em desestatização, surge logo a indagação: de onde virão os recursos para o setor voluntário comprar as empresas do setor coercitivo? Uma resposta complexa é explicar que: 1) o governo não gera recursos e sim administra os recursos hauridos do setor voluntário por tributação ou tarifas; 2) que a poupança do governo é hoje negativa e que seu déficit é coberto mediante sucção da poupança privada; 3) que, na medida em que o Governo corte suas despesas, liberando a poupança privada, esta poderia comprar as empresas do “setor coercitivo”. Estas, aliás, não nasceram do nada e sim de tributos pagos pelo “setor voluntário”. A velocidade de geração de recursos para a privatização dependeria assim apenas da velocidade da redução do déficit público e da liberação das poupanças do setor voluntário.   

Num sentido fundamental, entretanto, o problema é simples e não exige qualquer despesa. Basta uma revolução conceitual, que pode ser feita por definição legal. O importante, num primeiro estágio, é separarmos o conceito de propriedade, do direito de gestão, diferenciando-se “ações de propriedade” de “ações de gestão”. O Governo é gestor das despesas públicas. Mas não precisa ser seu proprietário. As empresas públicas devem ser do público.

É esse o objetivo do projeto de lei número 139 que apresentei ao Senado Federal, em junho de 1983, e que há dois anos ali dorme o sono dos justos, pois as ideias simples são em princípio escandalosas. Nesse projeto se prevê que o governo devolva aos cidadãos a propriedade das poupanças deles arrecadadas, mediante a transferência gratuita de ações integralizadas – boas ou más – que sejam de propriedade da União, suas autarquias e entidade públicas, a um grande fundo de repartição de capital. Todos nós, contribuintes do INPS ou IPASE ou Funrural receberíamos gratuitamente frações ideais desse fundo. Os dividendos eventualmente resultantes seriam creditados aos cotistas, vale dizer, ao universo dos contribuintes, cujos impostos financiaram originalmente a criação dos elefantes estatais. As ações ficariam em custodia num organismo central, que poderia ser a Caixa Econômica Federal, ou qualquer outro órgão suficientemente computadorizado, que manteria escrituração da carteira de ações dos beneficiários. Enquanto mantidas em custódia, essas ações seriam de propriedade, porém não de gestão. O poder de voto e de gestão continuaria, como no presente, nas mãos dos administradores governamentais, até que essas ações doadas se transformassem em ações vendidas ou negociadas, através dos mecanismos normais de Bolsas de Valores ou de licitação de ações. O projeto de lei acima citado prevê que a alienação das ações ou a retirada da custodia se faça gradualmente (à razão de 5% ao ano), a fim de na se congestionar o mercado de valores.

Se a privatização da propriedade pode ser resolvida, resta o problema da privatização da gestão, indispensável para aumento da produtividade global do sistema. Esta continuaria a ser buscada através dos programas correntes de desestatização, por venda em bolsa ou licitação. O importante seria abandonarmos a ideia – usada pelos estatizantes para sabotar a desestatização – de que o Governo tem que reaver integralmente o capital investido. Em muitos casos, os investimentos foram superdimensionados, com custos financeiros tornados proibitivos pela lerda execução, de sorte que seria irrealista esperar vendê-las senão pela rentabilidade real ou esperada do patrimônio, aferida segundo as regras do mercado. 

O programa de “repartição do capital” inauguraria imediatamente o capitalismo do povo. O programa de “desestatização” aumentaria gradualmente a eficiência de gestão, além de trazer receitas, que o Governo utilizaria para sanar aflitivas carências básicas – analfabetismo, endemias e epidemias, desnutrição e insuficiência dos serviços básicos de infraestrutura. Não faz sentido o governo ter postos de gasolina quando não tem postos de saúde, ou competir na fabricação de computadores quando não tem dinheiro para cuidar da malária...

Se há hoje uma constatação universal é a da falência do Estado-empresário. Até mesmo os regimes socialistas estão sentindo a rigidez e o desperdício dos sistemas centralistas. No universo das estatais brasileiras, o julgamento da eficiência é dificultado porque, contrariamente ao previsto no Art. 170, Parágrafo 20 da Constituição Federal, elas desfrutam de privilégios de mercado ou vantagens fiscais inacessíveis às empresas privadas. A Petrobrás, por exemplo, é lucrativa, mas desfruta de um monopólio que impede a aferição de eficiência. O Banco do Brasil é lucrativo, mas recebe recursos trilionários da Conta de Movimento do Tesouro a juros simbólicos, e coleta depósitos compulsórios de entidades públicas, sem ter que pagar os altos custos de captação. A Vale do Rio Doce e Usiminas, que operam superavitariamente e sem subsídio, em mercados competitivos, figuram talvez entre as únicas empresas sobre cuja eficiência não pairam dúvidas. Os grupos Telebrás e Eletrobrás não podem ser julgados porque operam em condições monopolísticas, caso em que o lucro pode resultar de manipulação tarifária e não eficiência competitiva.

O importante é acentuar que o Ministro Dornelles e Roberto Gusmão, que pregam a privatização por sentirem na carne os abusos dos elefantes enlouquecidos do setor coercitivo, não precisam se preocupar inicialmente com a carência de recursos para a privatização. Podemos privatizar imediatamente a propriedade por transferência gratuita, e, mais gradualmente, o voto e a gestão, pela venda convencional das ações à medida que o mercado as absorva. Mas mesmo o primeiro passo tem consequências psicológicas importantes. Sentindo-se proprietário, ainda que em frações minúsculas, das empresas públicas, os contribuintes se interessariam em fiscalizá-las, na esperança de algum dividendo, e para isso se organizariam em associações civis, a fim de se manifestarem nas assembleias gerais. Os gestores, sentindo-se também coproprietários, ainda que microscópios, talvez deixassem de considerar os dinheiros públicos um bem de ninguém. E o lucro da empresa passaria a ser considerado o que realmente é, um prêmio do desempenho e não uma secreção de cupidez capitalista. É uma perfeita imbecilidade dizer-se que não se pode privatizar as estatais porque elas são “patrimônio do povo”. Precisamente por isso é que devem ser privatizadas, na forma indicada no projeto de lei número 139. Para que sejam do povo. Hoje são dos tecnocratas, que às vezes delas abusam, ou dos políticos, que as desfiguram. O povo não tem vez.... 

Esta proposta acima ,foi elaborada pelo gênio Roberto Campos, se tivéssemos adotado suas recomendações, hoje este lugar não estaria, padecendo de todas as mazelas que padece, ignorante a nação que não aprende com a história. em 1985.

Defensor apaixonado do liberalismo. Economista, diplomata e político também se revelou um intelectual brilhante. De sua  intensa produção, resultaram inúmeros artigos e obras como o livro A Lanterna na Popa, uma autobiografia que logo se transformou em best-seller. Foi ministro do Planejamento, senador por Mato Grosso, deputado federal e embaixador em Washington e Londres. Sua carreira começou em 1939, quando prestou concurso para o Itamaraty. Logo foi servir na embaixada brasileira em Washington, e, cinco anos depois, participou da Conferência de Bretton Woods, responsável por desenhar o sistema monetário internacional do pós-guerra.

                                              Que falta você faz ao Brasil.

                                                           


sexta-feira, 7 de julho de 2017

No socialismo encontrarão, somente miséria e servidão


                              Resultado de imagem para Socialismo cubano é a miseria e servidão   


O mito da qualidade de vida em Cuba

Tão débil quanto mito que sugere que os países nórdicos sejam socialistas (ou pelo menos Estado do bem-estar social) é a falácia da elevada qualidade de vida em Cuba. Como bem teorizaram Mises e Hayek é impossível para uma economia planificada produzir qualquer bom resultado socioeconômico devido ao “problema de calculo econômico” e “problema de dispersão do conhecimento”. O mito de que Cuba tenha uma elevada qualidade de vida, parte do ranking de Índice de Desenvolvimento Humano, divulgado anualmente pela ONU. Com isto, socialistas no mundo inteiro, deixam de ignorar o absoluto fracasso da URSS, China e Coreia do Norte, dentre outras nações para focar seus argumentos em um suposto sucesso cubano. O que os militantes socialistas se esqueceram de relatar (é mais provável que desconheçam) é o fato de que Cuba não permite vistorias internacionais a fins de verificar sua qualidade de vida. Todos os índices publicados pela ONU são enviados pelo governo. É fato histórico que todas as ditaduras socialistas, jamais permitiram que sua pátrias fossem assistidas internacionalmente.

O motivo para Cuba proibir vistorias internacionais profundas é claro, historicamente notório e de fácil entendimento e herança de antigos regimes socialistas. A URSS, por exemplo, enviava dados à ONU que a colocava como 26º em IDH. Todavia em 1990, com a dissolução do bloco e a introdução da análise internacional, seu epicentro: a Rússia despencou mais de cinquenta posições. As demais nações que formavam a URSS apareceram em posições muito piores que o centro do governo comunista. Logo, confiar nos dados cedidos pela economia planificada de Cuba, seria como confiar nos dados cedidos pela URSS. Doravante, a ideia de um IDH cubano elevado é de fácil refutação. O IDH combina três fatores: o primeiro é o Índice de Educação que calcula o numero de pessoas alfabetizadas e a taxa de escolarização, o segundo é a Longevidade que analisa a expectativa de vida, mortalidade infantil e a qualidade da saúde, o terceiro fator é a Renda a partir do PIB per capita e do PPP (pode de paridade e compra). Tendo em base a metodologia de medição usada pelo IDH, podemos garantir que o IDH de Cuba é falso.

É de conhecimento internacional que o PIB cubano não é calculado nos padrões internacionais. A ditadura castrista soma valores referentes a todo setor público às precárias atividades econômicas da ilha, ,produzindo uma elevação artificial. Segundo a ditadura, a renda per capita cubana é de UU$ 10.200 (2015) enquanto a mais elevada média salarial anual chega a míseros UU$ 300 (médicos mais bem pagos) em uma desproporção assombrosa. Também cabe citar que o PPP é um método que não pode ser usado em uma economia fechada com uma taxa de câmbio arbitrada pelo governo. Outro fator é a saúde: acalmada pelos “baixos índices” de mortalidade infantil. De acordo com os números cedidos de Cuba à ONU, a ilha está na 44º colocação no ranking mortalidade infantil. Entretanto, segundo a ONU, em 1958, (um ano antes à revolução) Cuba estava na 13º colocação. Logo encontramos um nítido retrocesso neste quesito, embora Cuba divulgue valores muito superiores a realidade, através de mentiras estatísticas impostas pelo regime.

Em 2011 o Dr. Juan Felipe Garcia da Florida entrevistou diversos médicos refugiados que alegaram que pediatras falsificam registros a pedido do regime. Eles não somente encobrem a morte precoce de crianças, como fazem dezenas de abortos diariamente. Mesmo sem sinais de anomalia na gravidez o aborto é uma prática usada para reduzir as taxas de mortalidade infantil, quando a realidade socioeconômica as levaria inevitavelmente ao óbito. A realidade da medicina cubana é oposta as imagens filmagens de Michael Moore. Ele apenas filmara os hospitais pagos em dólar para estrangeiros e para as elites políticas. Vários cinegrafistas amadores gravaram hospitais como os que foram exibidos pela Fox News e que revelam a medonha realidade cubana: postos de saúde fechados ou com mínimos medicamentos, hospitais sem infraestrutura, imundos, repletos de sangue, com aparelhos ultrapassados há década, além de pacientes insatisfeitos e médicos frustrados. A medicina cubana é tão precária que em 2015 o governo de Cuba informou sobre um novo surto de cólera em seu território com 163 casos, incluindo 12 turistas.

Há um outro fato inegável sobre a ilha; há mais de 50 anos Cuba sofre de um severo racionamento, tal como ocorre em qualquer nação socialista. Devido ao problema de cálculo econômico, Cuba sofrera imensa escassez logo no início de seu revolução socialista. Em 1963, o governo criou uma caderneta de racionamento usada para que a população possa adquirir uma pequena quantidade de produtos nas distribuidoras estatais. Nestas distribuidoras quase tudo é de má qualidade. Em exemplo não há partes nobres de carnes a disposição da população. O leite é extremamente difícil de se adquirido de tal forma que não dura poucos dias. Toda a população passa horas enfrentando longas filas para conseguir uma unidade diária de pão. E esta situação piora gradativamente de modo que o número produtos disponíveis na lista estatal tem escolhido ao redor dos anos. A única forma de conseguir tais produtos é através do mercado negro por um preço elevado devido a marginalização do comércio privado.

Outra grande falácia a respeito da ilha é sobre seu sistema educacional. As escolas cubanas estão séculos de distancia das escolas na Coreia do Sul, com um computador por aluno, bibliotecas enormes, infraestrutura completa, professores altamente capacitados e até mesmo robôs em sala de aula. Um exemplo claro é que 75% dos estudantes que cursaram graduação de medicina em Cuba (seu suposto melhor curso) não foram capazes de revalidar seu diploma na UFMG em 2015. O mesmo ocorre em todo mundo. Cubanos não participam de análises internacionais para testar o conhecimento de seus alunos ou professores. Em  filmagens amadoras são deflagradas mentiras a respeito das nações capitalistas e ocidentais enaltecendo Cuba, tal como se fosse a nação mais prospera do globo. Cuba também é  notória na censura e reconhecida mundialmente por violar os direitos humanos através de práticas como tortura, prisões arbitrárias, julgamentos injustos, execução extrajudicial, pela perseguição e exclusão de negros, mulheres e homossexuais.


Basta um pequeno passeio pela ilha para notarmos o nível da obsolescência cubana. Prédios em ruínas, sem pintura, ruas sujas, banheiros imundos, lojas com absoluta escassez, filas enormes em toda a ilha, carros que são peças de museus, ruas lotadas de prostitutas, nenhum acesso à tecnologia em um clima de nostalgia que lembra os anos 50. Leigos em história e economia poderiam alegar que todo fracasso cubano deve-se ao embargo norte-americano, o que obviamente é uma mentira. Em 2015 Cuba negociou com 96 países incluindo os EUA. Suas importações cresceram acentuadamente nas ultimas décadas. O problema de Cuba esta em sua quase nula produtividade, pois não há espaço para empreendedores. Mesmo que Raul Castro tenha liberado terras a agricultores privados e o direito de comercializar a determinados indivíduos faltam equipamento para trabalhar a terra e bens para serem comercializados uma vez que tudo deve passar antes pelo governo. A única solução para Cuba é dar fim a ditadura, privatizar setores, desregulamentar a economia como fizera a Rússia, China e Vietnã. No socialismo encontrarão somente a miséria e servidão!

                                                        

terça-feira, 27 de junho de 2017

Terceirização uma necessidade , para evolução do mercado de trabalho no Brasil.

                                            


O tema da semana foi o PL 4330/04, aquele que regulamenta a terceirização. Não sou da área de economia do trabalho, mas por estudar crescimento econômico acabo acompanhando a literatura de economia do trabalho. A bem da verdade devo confessar que não foi na literatura de economia do trabalho que me apoiei para afirmar que o PL 4330/04 é bom para a economia brasileira, minha afirmação tem por base a literatura de crescimento econômico. Não são poucos os pesquisadores que dedicam tempo a estudar crescimento econômico do Brasil que concordam que o excesso de burocracia e restrições legais são um dos maiores entraves para que o Brasil volte a crescer. Ao oferecer novas alternativas de arranjos trabalhistas o PL 4330/04 ajuda a reduzir restrições a acordos voluntários em um mercado crítico como o mercado de trabalho.


A princípio não levei em conta questões jurídicas ou se a terceirização era instrumento eficiente de gestão o que tem implicações no quão útil a lei será. Não levei em conta questões jurídicas porque é quase impossível para um leigo (ou mesmo para um advogado que não milite em causas trabalhistas) avaliar o impacto jurídico de medidas que afetam as relações de trabalho no Brasil. É um emaranhado tão grande de leis e exceções, de jurisprudências de brechas legais e coisas do tipo que entendi por bem que seria melhor não entrar na questão, afinal estava discutindo o assunto na internet e não escrevendo um artigo científico ou mesmo um relatório técnico sobre impactos da terceirização. Não entrei em questões de gestão por motivos diferentes (não sou administrador, mas não teria dificuldades em conversar sobre o tema com alguns dos vários administradores que lecionam no departamento de administração da UnB), se a terceirização não for boa para a firma entendo que a firma não será afetada pelo PL 4330/04, afinal o PL não obriga ninguém a terceirizar, apenas oferece a opção.

Como assunto cresceu mais do que imaginei acabei por procurar opiniões de quem entende de direito e de quem entende de administração. Encontrei várias, sugiro ao leitor uma entrevista com o advogado Sérgio Schwartsman (link aqui) e um post no FB do administrador de empresas Stephen Kanitz com a discussão que segue o post (link aqui). Caso o leitor queira outras opiniões é só buscar na internet, existem várias. Mas não é para defender a terceirização que estou fazendo este post, nem mesmo é para criticar. Faço o post para chamar atenção da pobreza do caso contra a terceirização.

O número mágico que está na internet é que terceirizados ganham 25% menos do que trabalhadores que são contratados diretamente pela empresa. Tal número pode ser encontrado em várias reportagens na imprensa, em posts de blogs e no FB e em vídeos que circulam pela internet. Por exemplo, o site UOL afirma “Salário médio dos terceirizados em 2013: R$ 1.776,78 (25% menor que os R$ 2.361,15 dos contratados diretamente)” (link aqui). A Carta Capital diz: “O salário de trabalhadores terceirizados é 24% menor do que o dos empregados formais, segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).” (link aqui). O blog Viomundo afirma: “Segundo o documento, em dezembro de 2013, os trabalhadores terceirizados recebiam 24,7% a menos do que os contratados diretos...” (link aqui). O Estadão cita um número diferente (talvez por algum ajuste nas horas) mas aponta a CUT como fonte na chamada que anuncia: “Terceirizados ganham 27,1% a menos que contratados diretamente, diz CUT.” (link aqui).

Provocado em uma conversa no FB decidi procurar o estudo da CUT e descobrir de onde veio o número. O estudo se chama “Terceirização de Desenvolvimento: uma conta que não fecha” (link aqui). A tabela com o número que está sendo usado para criticar o PL 4330/04 é a Tabela 2 que está na página 14 e que eu reproduzo abaixo:




Reparem na fragilidade do número. De início me preocupou que o estudo não controlasse por atividade desempenhada pelo trabalhador. Como atualmente a terceirização só é permitida para atividades meio e é razoável supor que atividades meio ganhem menos que atividades fins independente da forma de contrato eu desconfiei do número. Imagine um hospital, o leitor ficará surpreso em saber que um médico (atividade fim) ganha mais que um servente (atividade meio)? O leitor ficará surpreso em saber que em uma universidade os professores (atividade fim) ganham mais que o porteiro (atividade meio)? Imagino que não. Pois dizer que terceirizados ganham menos que contratados direitos sem controlar por atividade exercida é praticamente o mesmo que dizer que médicos ganham mais que serventes ou professores ganham mais que porteiros. Mas o estudo é ainda mais frágil. Repare que a tabela fala de “Setores Tipicamente terceirizados” e “Setores Tipicamente contratantes”. O que significa isto? Significa que sequer o estudo da CUT está considerando o salário dos trabalhadores terceirizados, o estudo considera o salário dos setores que são classificados como setores tipicamente setorizados.

Grosso modo o que o estudo da CUT está dizendo é que em setores onde terceirização é comum o salário é menor. Quais são estes setores? Procurei um anexo onde estivessem listados quais são os setores tipicamente terceirizados, mas não encontrei. Porém, considerando que a lei apenas permite a terceirização de atividades meio, é bem plausível supor que tais setores são os que atividade meio tem mais peso. Desta forma o que estudo está dizendo é que setores onde atividades meio sujeitas à terceirização são preponderantes pagam salários menores. Tais setores, segundo os números da CUT e do DIEESE, equivalem a 26,8% dos setores (pg.13). Não é quase como dizer que porteiros ganham menos que médicos, é dizer que porteiros ganham menos que médicos.

Se ainda resta alguma dúvida da fragilidade do estudo considere a Tabela 7 (pg.19) nela é dito que 22,7% dos profissionais contratados diretamente tem nível superior, dos terceirizados apenas 8,7% tem nível superior. Não ficaria surpreso se a diferença na educação explicasse boa parte na diferença de salário, o estudo da CUT sugere que não e justifica a alegação dizendo que: “Se observarmos apenas o ensino médio completo, o número de trabalhadores em setores tipicamente terceirizados e tipicamente contratantes é praticamente o mesmo: 46%.”. Ao focar no ensino médio e “esquecer” a diferença no pessoal com superior completo o estudo da CUT parece ignorar que a distribuição de renda no Brasil não é exatamente igualitária e, por isso, é preciso considerar o que acontece na ponta superior. Uma leitura dura do texto da CUT diria que o texto afirma que serventes ganham menos e tem menos capital humano do que médicos porque serventes são terceirizados e médicos não. A mesma leitura diria que a CUT afirma que vigilantes estão mais sujeitos a acidentes de trabalho do que professores porque são terceirizados. Parece absurdo? É absurdo. Mas é este estudo que jornais e blogs estão usando para criticar a terceirização. Peguei pesado com o estudo? Peguei, mas dado o uso que está sendo feito é necessário pegar pesado, ademais, a leitura dura que fiz é mais próxima da realidade que a leitura que estão apresentando do estudo da CUT.

A bem da verdade o texto da CUT trata das atividades no Capítulo 3. Terei sido precipitado ao criticar o estudo? Deveria minha crítica ter sido dirigida apenas a jornalistas e blogueiros que escreveram seus textos antes de chegar ao terceiro capítulo? Não. A análise por atividades não trata da atividade executada pelo empregado como deveria tratar, a análise diz respeito a atividade das firmas. O primeiro exemplo é da Volkswagen. Trata de um caso onde existem terceirizados de primeira linha (moduladores) e terceirizados de segunda linha (vigilantes, alimentação, construção civil, transporte de cargas, etc.). O que diz o estudo da CUT:

“O modelo de salários e benefícios dos cerca de 3.000 trabalhadores da Volkswagen e modulistas garante certa homogeneidade. Todos são enquadrados como metalúrgicos, portanto, representados pelo mesmo Sindicato; têm os mesmos Acordos (inclusive Participação nos Lucros e Resultados, PLR) e Convenção Coletiva; têm uma mesma Comissão de Fábrica eleita por todos e que negocia as mesmas condições para todos; e têm uma única estrutura de cargos e salários negociada com o Sindicato e Comissão de Fábrica - no entanto, evidentemente as funções e salários são diferenciados, particularmente entre trabalhadores na Volkswagen e nas modulistas.
Já os demais 1.500 trabalhadores terceiros são enquadrados em várias outras categorias (vigilantes, alimentação, construção civil, transporte de cargas, etc.), cada um com “seu” sindicato respectivo, seus acordos e convenções coletivas, bastante inferiores aos do Consórcio Modular em que estão inseridos.”

Perceberam? O próprio estudo reconhece que existem terceirizados que possuem melhores condições de trabalho que outros. O que os diferenciam? No texto aprendemos que são diferenciados por sindicatos e por atividades que desempenham. Qual das duas diferenças deve ser mais importante para explicar a diferença de salários? Está em dúvida? Pense comigo, médicos ganham mais que serventes por estarem em sindicatos diferentes ou pelas funções que exercem? Bingo!

A coisa não melhora até aparecer o caso da Usiminas na Tabela 12 (pg.46). Segundo a tabela, que ao contrário das outras não tem fonte, empregados terceirizados em função de limpeza na Usiminas ganham 66% do que ganham os contratados diretamente no mesmo setor. É praticamente o único dado relevante para a crítica ao PL 4330/04 que o estudo apresenta, finalmente é considerada a mesma atividade na mesma empresa. Porém como saber se não é uma característica da Usiminas? A Usiminas era uma empresa estatal que foi privatizada em 1991, é possível que o pessoal de limpeza que ganhe R$ 1.200,00 contra os R$ 800,00 dos terceirizados sejam remanescentes da época em que a empresa era estatal. Mais que possível eu diria que é provável. Por que uma empresa que terceiriza um setor manteria empregados contratados no setor? Talvez por exercerem cargos de chefia (o que por si explica a diferença) ou talvez por contratos que impedem ou tornam muito cara a demissão. Infelizmente os autores do estudo da CUT não deram muitas informações sobre o exemplo e não é possível avaliar o que está acontecendo. A parte final do capítulo dedicado a atividades é dedicada ao setor público. Creio que é o setor onde os argumentos de perdas de direitos e pioras nas condições de trabalho sejam mais adequados, é bem provável que o setor público, inclusive administrações do PT e PCdoB (partidos que votaram contra o PL 4330/04) usem da lei para driblar o regime jurídico que rege os servidores públicos. Não creio que alguém acredite que a ganancia dos empresários, a guerra de classes ou o capitalismo selvagem possam ser culpados pelo uso que gestores públicos farão da nova lei.

Se alguém ainda tem dúvidas da fragilidade do estudo da CUT que olhe as referências bibliográficas. Toda a vasta literatura de economia do trabalho no Brasil e no exterior é solenemente ignorada. Se estou ofendido por a CUT ter ignorado os economistas? Não. Estou incomodado que a CUT não tenha consultado nenhum artigo publicado fora do Brasil e também não tenha consultado estudos publicados em periódicos científicos no Brasil. O projeto ficou onze anos na fila para ser votado, a CUT é uma central sindical grande e rica, que em todo este tempo a CUT não tenha preparado um estudo robusto sobre o tema mostra o pouco interesse da central sindical em fomentar um debate rico a respeito de um tema que afeta diretamente vários trabalhadores. Fica difícil espantar o pensamento que a CUT quer mesmo é fazer barulho para evitar a mudança no jogo de poder e na arrecadação dos sindicatos que o PL 4330/04 trará caso seja transformado em lei.

                                             

quinta-feira, 1 de junho de 2017

As complexas razões da xenofobia européia.


                                        



Direita xenófoba na Europa contemporânea

Nas últimas três décadas, tem-se observado uma subida assinalável dos partidos xenófobos, profundamente conservadores e mesmo de extrema-direita ao longo de grande parte da Europa

Nas últimas três décadas tem-se observado uma subida assinalável dos partidos xenófobos, profundamente conservadores e mesmo de extrema-direita ao longo de grande parte da Europa.  Enquanto há trinta anos, a maior parte dos partidos xenófobos não conseguia sequer passar o limiar mínimo dos 5%, que é necessário para entrar no governo, verifica-se que atualmente eles constituem tanto como ~28% do parlamento em países como a Áustria e questionavelmente alcançaram o nível de ~70% na Hungria. [2] Por volta de 1999, os austríacos, que tradicionalmente se arrogam como sendo “as primeiras vítimas” do Terceiro Reich, tinham elegido governador da Caríntia Jörg Haider, proeminente nacionalista acusado de negar o holocausto, e dado ao seu Partido da Liberdade mais do que 26% de votos nas eleições nacionais. Haider ajudou pessoalmente a desmontar os sinais rodoviários que tinham sido colocados para a minoria eslovena local. O partido Aurora Dourada, que tem agora mais do que ~7% da votação nacional na Grécia, desfila frequentemente nas ruas de Atenas com bandeiras com símbolos rúnicos e com botas que facilmente recordam as gerações mais velhas da ocupação nazi de 1941-45. Mais recentemente, o Aurora Dourada distribuiu refeições grátis às populações gregas racialmente “genuínas”.  Ao mesmo tempo, membros proeminentes do poderoso partido húngaro Jobbik pediram mesmo ao governo que preparasse listas de judeus que pudessem “ser uma ameaça à segurança nacional húngara.” 
Esperando compreender estas surpreendentes mudanças no clima político europeu, este post irá fazer uma breve análise das características da direita xenófoba a partir de 2015, sublinhar a diversidade dos partidos xenófobos e tentar explicar alguns dos padrões encontrados quando a extrema-direita toma o comando assim como as exceções. As percentagens aproximadas que vêm junto aos partidos referem-se à parte aproximada dos parlamentos nacionais de acordo com as mais recentes eleições e são corroboradas pelos respectivos sites governamentais dos países. Torna-se evidente que é muito difícil localizar padrões comuns que possam explicar quando e porquê a extrema-direita ganha força na Europa.
A mudança para a extrema direita que perpassa a Europa é talvez tão surpreendente quanto alarmante, considerando que os espectros da 2ª Guerra Mundial e do totalitarismo ainda estão frescos na memória histórica de praticamente todas as sociedades europeias. Ainda mais surpreendente é o fato de que a direita xenófoba conseguiu alguns dos seus maiores sucessos em países, pasmem, que estão habitualmente associados ao liberalismo e ao multiculturalismo, incluindo a Suíça, a Suécia, e Bélgica e a Holanda. Mesmo na supostamente tolerante Suíça, o poderoso Partido do Povo Suíço (~26%) restringiu a construção de mesquitas e minaretes e fez mesmo campanha com um anúncio que mostrava três ovelhas brancas a expulsar uma ovelha negra para fora do país.  Partidos racistas de extrema-direita como o Vlaams Belang na Bélgica estavam a ganhar popularidade até que foram proibidos por extremismo em 2004. Nas eleições de 2003, o Vlaams Belang alcançou quase 12% dos assentos na Câmara dos Representantes. Observadores ocidentais esforçaram-se especialmente por compreender como é que a extrema-direita conseguiu tão depressa aparecer na Grécia, o suposto berço da democracia. A crescente popularidade da direita no continente é uma fonte de grande preocupação para os grupos de direitos humanos em Bruxelas, que constantemente encorajam os tribunais nacionais a ilegalizar partidos xenófobos pelo motivo de que violam as proteções internacionais contra o racismo.
Este mapa traça a propagação de partidos xenófobos eleitos na Europa a partir de 2013. Quando se olha para um mapa, o crescimento da extrema-direita é impressionante. O verde refere-se aos países em que um partido xenófobo está no governo e o cinzento significa que não têm nenhum no poder. 
Contudo, é crucial compreender que “a extrema direita” não pode ser homogeneizada ou reduzida às imagens típicas do fascismo, do neonazismo, do racismo ou da ditadura que podem surgir nos nossos espíritos quando pensamos na direita na história europeia. Os partidos xenófobos têm juntado crescente apoio de votantes de distintas ideologias políticas sobretudo por causa do crescente descontentamento com o status quo. À medida que as vulnerabilidades da União Europeia se tornam mais evidentes, cada vez mais pessoas reclamam por reformas na economia pan-europeia, na integração, na imigração de fronteiras abertas e no multiculturalismo, princípios que moldaram o desenvolvimento da Europa desde a 2ª Guerra Mundial. Com um desemprego galopante em quase todo o continente, imigração em massa vinda de África, da Ásia e dos Balcãs ( brancos ) na Europa Ocidental e aquilo que muitos sentem ser uma estrutura económica e política falida da União Europeia, votantes de várias origens parece escolherem soluções radicalmente diferentes para as crises em curso na Europa.
Com isto em mente, é importante reconhecer que os movimentos políticos da direita xenófoba são tão diversos como os partidos social-democratas e de extrema-esquerda. Incluem tradicionalistas, pró-europeístas, eurocépticos, democratas, nacionalistas, racialistas, neonazis e mesmo verdes. A maior parte dos partidos xenófobos que exigem imigração restrita são convictamente democráticos. A maior parte advoga uma abordagem tradicional, conservadora ou mesmo moderada de resolver os problemas da Europa no interior do processo democrático. Estes nacionalistas relativamente moderados incluem os Verdadeiros Finlandeses (~19%) da Finlândia, os Democratas da Suécia (~6%), o Partido do Povo Dinamarquês (~12%) e o Partido Popular de Portugal (CDS/PP) (~11%). Mesmo o partido Fidesz da Hungria (~53%) advoga uma plataforma conservadora em vez de uma agenda militante ou autocrática, apesar de criticada pela imprensa ocidental como de extrema-direita ou mesmo de ditadora depois de ter feito emendas à constituição de modo a reforçar o poder executivo.  Em alguns países como a Sérvia e a França, os partidos da extrema-direita têm pouca força parlamentar mas mesmo assim orgulham-se de terem figuras públicas muito populares. A Front National de França só tem dois lugares em 577 na Assembleia Nacional, mas Marine Le Pen ficou em terceiro lugar nas eleições presidenciais de 2012 com quase 18% dos votos. O Partido Radical Sérvio extremista e racialista nem sequer está no governo nacional, mas o seu antigo dirigente Tomislav Nikolić foi eleito presidente da Sérvia em 2012. Resumindo, devemos ser cuidadosos ao incluirmos todos os movimentos xenófobos na mesma categoria. Eles variam tanto em relação ao seu apoio popular como em relação à sua ideologia e nem todos eles abraçam agendas antidemocráticas, fascistas ou autoritárias.
Embora todos estes partidos tenham a sua quota-parte de apoiantes, que têm uma abordagem mais violenta ao atacar a imigração, a maior parte dos partidos na “extrema-direita” são melhor descritos como conservadores e xenófobos. A maioria advoga um sistema democrático pluripartidário e não exigem nenhuma futura revisão da constituição que pudesse repudiar consultas e equilíbrios democráticos. A maior parte exige uma solução não violenta para as questões da imigração e da economia da Europa. Mesmo partidos nacionalistas como a Nova Aliança Flamenga (~17%) e o Vlaams Belang (~8%) da Bélgica são lealmente nacionalistas étnicos, mas a sua ideologia deriva mais de um desejo de reforçar os direitos da população flamenga do que das suas intenções de visar os imigrantes. A mesma tendência se aplica à bastante moderada Aliança Nacional da Letónia(~14%) e o Partido da Ordem & Justiça da Lituânia(~13%), que estão muito preocupados em equilibrar a historicamente desproporcionada influência das minorias russas que se estabeleceram nestes estados durante a era soviética. 
Os únicos importantes partidos eleitos que tomam uma postura agressiva, racialista, militante são o Partido Jobbik da Hungria (~17%), o Svobodada Ucrânia(link is external)
(~11%), a Aurora Dourada da Grécia (~7%), e o “Attack!” da Bulgária (~10%). Por exemplo, enquanto a maior parte dos partidos gregos são pelo menos até um certo ponto nacionalistas culturais (incluindo os socialistas do PASOK) que permitem que imigrantes como os albaneses se assimilem na cultura grega, só o Aurora Dourada frequentemente vê os “Gregos” como uma categoria racial exclusiva. A extrema-direita húngara, ucraniana e búlgara faz frequentemente exclusões semelhantes. Contrastando com isso, os “nacionalistas moderados” como os Democratas da Suécia estão mais interessados em travar a imigração sem limites do que em questões raciais. Muito diferentes são partidos mais militantes como o Jobbik, que é muitas vezes acusado de ter ligações à Guarda Húngara (Magyar Gárda), uma organização quase paramilitar que tem sido comparada às camisas castanhas da SA Alemã. Apesar de os nacionalistas búlgaros, a Aurora Dourada e o Svoboda não terem organizações equivalentes, os seus apoiantes têm estado largamente ligados ao vandalismo e a agressões contra imigrantes, mesquitas e sinagogas em Atenas, Sofia e Kiev. Também é largamente tomado como certo que a polícia de Atenas coopera com a Aurora Dourada ou que pelo menos faz vista grossa durante as frequentes agressões a imigrantes albaneses, turcos e muçulmanos na capital

Embora as fragilidades económicas que têm varrido a UE desde 2008 se tenham tornado cada vez mais óbvias, a principal razão por detrás do aumento da direita xenófoba não é as alternativas económicas que oferece, mas sim a sua hostilidade em relação à imigração sem restrições oriunda de África, da Ásia e dos Balcãs. Mas também aqui, cada país e cada partido são muito diferentes. Os partidos xenófobos vão dos que simplesmente querem controlos fronteiriços mais apertados, aos que exigem uma política de imigração “só para brancos”, ou que exigem a total deportação das minorias. Embora praticamente todos os partidos xenófobos sejam pelo menos “eurocépticos soft”,alguns apenas exigem maior autonomia nacional dentro da UE, enquanto outros peticionam abandonar completamente a UE, sobretudo para resolverem a suposta crise de imigração.
Embora os partidos xenófobos desafiem as políticas de imigração como um todo, a maior parte da sua hostilidade está focada nos imigrantes muçulmanos, especialmente marroquinos, indonésios, árabes, somalis, afegãos e paquistaneses e também negros africanos. Importante referir que a xenofobia é frequentemente igualmente agressiva contra outros imigrantes europeus ou “brancos”, sobretudo albaneses, bósnios, gregos, ucranianos, búlgaros, polacos, bálticos, romenos e russos. Na Itália, a Liga Norte de centro-direita é mais xenófoba em relação aos italianos do sul do que em relação aos muçulmanos. A Aurora Dourada da Grécia é violentamente hostil aos albaneses. Na Suíça, a xenofobia é sobretudo dirigida contra os imigrantes da antiga Jugoslávia. Embora a maioria dos principais partidos xenófobos não sejam abertamente anti-semitas, o Jobbik da Hungria é largamente visto não só como anti-sionista mas como anti-judeu e também profundamente contra os ciganos. Os partidos de direita austríacos estão geralmente focados contra os eslavos e turcos, enquanto na Holanda o conhecido provocador Geert Wilders e o seu Partido Holandês da Liberdade (10%) são particularmente hostis contra os muçulmanos, especialmente indonésios e somalis. O militante partido Svoboda da Ucrânia (11%) dirige a maior parte da sua xenofobia contra os russos, os judeus, tártaros e os Roma, enquanto o convenientemente chamado Partido “Ataque!” da Bulgária (10%) é ferozmente contra os ciganos, contra os romenos e contra os turcos. O popular nacionalista búlgaro Volen Siderov foi tão longe ao ponto de clamar que a Bulgária ainda tem de ser libertada do “domínio turco (i.e. otomano)” enquanto os turcos e outros muçulmanos (presumivelmente os Pomaks que falam eslavo) “ocuparem” o país. Os diversos “alvos” dos partidos xenófobos demonstram que a extrema-direita é frequentemente bem sucedida em países com grandes populações imigrantes e onde a hostilidade para com os que chegam há pouco é mais forte. Igualmente, a diversidade destes alvos lembra-nos que não podemos generalizar movimentos de extrema-direita como se eles partilhassem os mesmos inimigos, as mesmas agendas, soluções ou mesmo princípios políticos.
  
Mapa que mostra a proporção de populações muçulmanas atualmente na Europa (incluindo populações indígenas e imigrantes). Igualmente incluídos os grupos étnicos que frequentemente são o foco da hostilidade dos partidos xenófobos. 
É deste modo difícil encontrar padrões que possam explicar porquê onde a extrema-direita conseguiu alcançar sucesso eleitoral. Muitos exemplos conduzem a resultados contraditórios e surpreendentes. É sugestivo que esta tendência ocorra durante um tempo de grandes dificuldades económicas – tal como a extrema-direita ganhou influência na Europa durante a depressão do pós 1ª Guerra Mundial no começo dos anos 20 e especialmente durante a Grande Depressão da década de 30. Considerando a ligação histórica entre instabilidade económica e ascenso da extrema-direita, é pois surpreendente que países como a Espanha e Chipre tenham movimentos de extrema-direita muito fracos apesar de terem sofrido um desemprego exponencial e uma tremenda dívida pública. Em vez disso, partidos de esquerda como o Partido Progressivo Eurocomunista de Chipre e os separatistas étnicos com tendências de esquerda da Catalunha têm tido um sucesso assinalável nos últimos anos.
Como outra possível explicação, poder-se-ia esperar que países de “trânsito” de imigrantes que recentemente experimentaram uma onde de imigração, como Malta, Itália e Chipre pudessem virar à direita. Mas não é em geral o caso. Com efeito, o poderoso Partido Nacionalista de Malta é profundamente conservador e pró-maltês enquanto a Itália tem vários pequenos partidos neofascistas como o da neta de Mussolini, Alessandra. Contudo, partidos xenófobos extremos como o Imperu Ewropew de Malta e a Forza Nuova de Itália têm tido muito pouco sucesso. Nem sequer estão no governo nacional.
Outros casos também tornam difícil encontrar padrões consistentes por detrás do crescimento da direita xenófoba. Poderíamos esperar países etnicamente diversos com grandes populações imigrantes como o Reino Unido terem fortes movimentos de direita. Contudo, o Partido Nacional Britânico não conseguiu atingir o limiar dos 5%. (O Partido da Independência do Reino Unido em crescimento é sem dúvida conservador e céptico relativamente à União Europeia, mas não é verdadeiramente xenófobo.) No entanto, a França, diversa e rica em imigrantes, viu o surgimento de poderosas figuras xenófobas como Marine Le Pen e o seu pai Jean-Marie Le Pen antes dela. Se a diversidade étnica por si só não desencadeia o crescimento da extrema-direita, poder-se-ia concluir que homogeneidade étnica fornece um terreno mais fértil para a xenofobia. É certamente o caso da Hungria, que tem de longe o maior movimento de direita na Europa em termos de resultados eleitorais. Também a relativamente homogénea Finlândia oferece substancial apoio aos partidos nacionalistas xenófobos como os Verdadeiros Finlandeses (~19%). Mas, outros estados relativamente homogéneos como a Polónia e a Noruega têm fracos partidos xenófobos.
Poderíamos também ser inclinados a olhar para características culturais básicas que pudessem explicar o crescimento da extrema-direita. É talvez intrigante que a Hungria pareça ser o primeiro país a virar para a extrema-direita, quando foi o primeiro a aprovar legislação anti judia nos anos 30 quando Miklos Horthy instalou uma ditadura de direita. No entanto, a xenofobia cultural por si só não parece emprestar sucesso eleitoral aos partidos de extrema-direita. Um exemplo excelente aqui é o da Roménia. Embora a cultura romena seja frequentemente descrita como profundamente xenófoba e agressivamente racista (particularmente contra os Roma e os Judeus e mesmo contra os Húngaros até certo ponto), o parlamento romeno é quase completamente social-democrata e socialista. O mesmo se podia dizer acerca da Polónia, da Sérvia e da Croácia. Mesmo países com passados marcados por genocídios como a Eslováquia, a Alemanha, a Croácia e a Sérvia não têm fortes partidos de direita. Outro exemplo chave é a Rússia. Embora a Rússia tenha aquilo que muitas fontes consideram ser a mais virulenta subcultura de skinheads e neonazis que fomentam a violência contra imigrantes do Cáucaso e da Ásia Central – partidos de extrema-direita como a Grande Rússia e a União de Todos os Povos da Rússia têm muito pequeno sucesso eleitoral.  Resumindo, não parece haver nada de inerente nas culturas nacionais europeias que ponha no poder os partidos xenófobos.
Uma última explicação acrescenta perspectiva e contradição. Podíamos esperar que países que enfrentam uma fase de transição difícil, traumática ou confusa se deslocassem para movimentos extremistas. Os estudos têm mostrado que o neonazismo, o nacionalismo e o Partido Democrático nacional estão muito mais fortes na antiga Alemanha Oriental do que no resto do país desde a queda do Muro de Berlim. Assim também este conceito de transição pode explicar por que os búlgaros e os ucranianos tendem a apoiar a extrema-direita à medida que se distanciam do seu passado comunista. Contudo, esta explicação cai por terra quando olhamos para outros antigos estados socialistas como a Roménia, a Polónia, a Rússia e a República Checa onde a extrema-direita é bastante débil. Só a transição e a insegurança cultural não dão uma explicação.      
Dois exemplos finais são talvez os mais surpreendentes quando se tenta explicar o aumento da extrema-direita: Noruega e Suécia. Os partidos de direita nunca tiveram grande sucesso em qualquer dos dois países. O poderoso Partido Progressivo (~22%) é apenas ligeiramente xenófobo e é mais bem descrito como nacionalista conservador. Os Democratas da Suécia são muito mais violentamente xenófobos mas só recentemente quebraram o limiar mínimo de 5% necessário para entrar no governo. Contudo, ao longo dos anos 90 e mesmo nos dias de hoje, a Noruega e a Suécia viram algumas das mais brutais ondas de violência contra os imigrantes na Europa. Embora estas atitudes não estejam de modo nenhum disseminadas na Escandinávia, esta aparente contradição podia reforçar a nossa conclusão de que a xenofobia cultural não significa que partidos xenófobos serão eleitos
Como este post demonstrou, a direita xenófoba tornou-se mais generalizada do que a maior parte dos observadores se aperceberam. Isto talvez seja desconcertante. Ao mesmo tempo que muitos europeus exigem maior integração e cooperação de modo a resolver os problemas da Europa, números crescentes de pessoas deslocam-se na posição inversa, advogando mais nacionalismo, homogeneidade e xenofobia. Contudo, a reação instintiva para interpretar esta tendência como um renascimento do fascismo, do nazismo, racialismo ou ditadura é tão sensacionalista quanto simplista. A direita xenófoba advoga plataformas culturais, políticas e económicas radicalmente diferentes em resposta à suposta crise da imigração. Também como os casos acima demonstram, não conseguimos explicar quando porquê a extrema-direita ganha força, apontando para padrões culturais, demográficos e económicos comuns. Quando consideramos os casos conflituantes e contraditórios na Europa anteriormente mencionados, fica por encontrar exatamente o que leva a que partidos da extrema-direita se tornem tão rapidamente populares. Cada movimento xenófobo tem de ser observado, com compreensível preocupação, país a país.