quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

O pesadelo do xeques árabes e dos muçulmanos.

O PESADELO DOS XEQUES
Com o petróleo de xisto americano e as novas reservas mundiais, os sauditas estão perdendo a hegemonia energética
Descobertas nos anos 1930, as reservas de petróleo na Península Arábica passaram a ser cobiçadas a partir da II Guerra. Nos anos 70, parecia que a economia mundial se equilibrava sobre um gigantesco oleoduto imaginário que levava o ouro negro do Oriente Médio para os Estados Unidos.
Na crise de 1973, quando os maiores produtores, mancomunados no cartel da Opep, passaram a controlar os preços e boicotar clientes, a falta de gasolina nos postos não deixou dúvida de que toda a população americana tinha se tornado refém de xeques milionários e de óculos escuros.
Quase todas as guerras que se seguiram na região pareciam ser justificadas pelo anseio de garantir esse suprimento vital. Nos últimos anos, esse quadro começou a ser alterado com o crescimento de países emergentes, principalmente a China, entre os principais consumidores.
No ano que vem, a mudança já em curso ganhará velocidade com a conquista, pelos Estados Unidos, do posto de maior produtor mundial. Em 2015, a produção americana vai ultrapassar a da Arábia Saudita e a da Rússia. Os americanos já falam até em exportar petróleo.
(CLIQUE NA IMAGEM PARA VÊ-LA EM TAMANHO MAIOR)
Com poços perfurando todas as regiões do mundo, a transformação estaria completa. As consequências econômicas já foram notadas por príncipes árabes assustados, mas as geopolíticas podem ser ainda maiores, à medida que o destino do Oriente Médio se torna menos vital para os Estados Unidos.
A irrupção do petróleo americano tem sua explicação no gás de xisto, um tipo de gás natural que se encontra misturado às rochas, em vez de estar concentrado em depósitos grandes. Sua extração depende de uma tecnologia chamada fratura hidráulica, pela qual grande quantidade de água misturada com areia e outras substâncias é injetada sob alta pressão no subsolo.
A operação provoca rachaduras, através das quais o gás escapa para o poço. O mesmo processo pode ser usado na obtenção do petróleo de xisto, mas, num primeiro momento, a viabilidade da exploração de gás era tão grande que os projetos petrolíferos foram adiados.
As primeiras empresas a assumir o risco de extrair esse óleo foram as de pequeno e médio porte, já que as grandes estavam ocupadas com os métodos convencionais. Entre 2004 e 2011, a produção de petróleo de xisto quintuplicou, e o item já representa 29% do total do país. “Foi o xisto o grande responsável por fazer a produção de petróleo americana crescer, depois de décadas de estagnação”, diz a economista americana Soozhana Choi, estrategista-chefe de petróleo do Deutsche Bank, em Nova York.
Oleoduto na Arábia Saudita, em 1961 (Foto: Three Lions / Getty Images)
Oleoduto na Arábia
Saudita, em 1961
As previsões pessimistas de que a era do petróleo se aproximava de um fim tiveram de ser refeitas. Entre os outros países que também podem se beneficiar do petróleo de xisto estão a Austrália, a China e a Argentina. A tecnologia para tal já está pronta, basta comprá-la.
Além do xisto, há o pré-sal no Brasil e as enormes reservas do México, que neste ano está modernizando sua ineficiente petrolífera estatal, a Pemex. Apenas um campo mexicano ainda pouco explorado, o de Chicontepec, no Estado de Veracruz, pode ter até 139 bilhões de barris, o que representa quase a totalidade das reservas do Irã.
A produção russa, a segunda maior do mundo, permanece estável. “Com múltiplos fornecedores, ficará mais difícil para a Opep controlar o mercado e determinar os preços”, diz Ann-Louise Hittle, da consultoria escocesa Wood Mackenzie, especializada em energia. Além dos países árabes, a Opep inclui nações africanas, o Irã, o Equador e a Venezuela.
O Oriente Médio não deixará de suprir o planeta. Quase a metade das reservas ainda está por lá. Mas a hegemonia energética da região está em queda. O príncipe Alwaleed bin Talal, da família real saudita, é um dos mais incomodados. Recentemente, afirmou que as tecnologias de exploração do xisto “são uma ameaça para qualquer país produtor de petróleo do mundo”.
A real preocupação de Bin Talal, evidentemente, é com o poder de seu próprio país, a Arábia Saudita. “Cerca de 92% do nosso orçamento vem desse produto”, disse ele. Por décadas, o petróleo foi o que permitiu a manutenção de reinos autoritários e seus aliados. Seus governos coibiram indústrias e outras atividades. Ao assegurarem a supremacia econômica, garantiram também influência política.
CORRIDA DO GÁS -- Funcionários de petrolífera privada em campo de exploração de combustíveis fósseis de xisto, no Texas (Foto: Bloomberg / Getty Images)
CORRIDA DO GÁS — Funcionários de petrolífera privada em campo de exploração de combustíveis fósseis de xisto, no Texas
A partir de agora, eles podem começar a perder o status de intocáveis pelas grandes potências. Em nome da segurança energética, os Estados Unidos enviam tropas para o Oriente Médio desde 1973. O foco da diplomacia mudou. Hoje, o maior desafio é impedir que a região se torne, cada vez mais, um celeiro de terroristas islâmicos.
                                                                       

Nenhum comentário:

Postar um comentário