O PT e seus aliados não aprendem com a história.
A exceção daquelas nações que adotaram o comunismo, é difícil
encontrar um exemplo de país cuja economia tenha sido mais espetacularmente destruída pelo seu governo do que a Argentina.
No início do século XX, a Argentina era o 10º país mais rico do mundo em termos per capita. A expressão "tão rico quanto um argentino" era comum e frequentemente
utilizada por aristocratas britânicos que tentavam casar suas filhas com
argentinos ricos. Entre 1860 e 1930, o país enriqueceu
acentuadamente em decorrência, entre outras coisas, da exploração das férteis
terras dos pampas. Os investimentos
estrangeiros eram livres e diversificados, oriundos da França, da Alemanha, da
Bélgica e, majoritariamente, da Grã-Bretanha. Indústrias e ferrovias foram construídas com capital estrangeiro. Os altos salários atraíram vários imigrantes, principalmente italianos, espanhóis,
alemães e franceses alfabetizados ao contrario do Brasil. Em 1899, após algumas décadas de
instabilidade financeira e bancária, o país retornou ao padrão-ouro e, durante 14 anos, cresceu a uma taxa anual de 7,7%.
Durante as três
primeiras décadas do século XX, a Argentina ultrapassou o Canadá e a Austrália
não somente em termos de população, mas também em termos de renda total e renda
per capita. Nesta época, a famosa
loja de departamentos Harrods, de
Londres, abriu uma filial em Buenos Aires, sua única filial em todo o
mundo.
A partir de 1930, no entanto, a coisa começou a
degringolar. Em termos macroeconômicos,
a Argentina era, até então, um dos mais
estáveis e sólidos países do mundo.
Mas o advento da Grande Depressão nos EUA, que afetou seriamente o
comércio mundial — e as exportações argentinas —, alterou este equilíbrio. Instabilidades políticas levaram a um golpe militar em 1930. De 1930 até os anos 1980, houve uma sequência
de governos populistas e juntas
militares que se revezavam no poder.
Estes sucessivos governos, capitaneados pelas teorias de Raúl Prebisch um economista esquerdista, adotaram uma série de políticas
protecionistas e de substituição de importações com o objetivo de alcançar a
quimera da 'autossuficiência', um devaneio que ainda hoje excita
praticamente todos os desenvolvimentistas (muitos deles estão em Brasília).
Oficialmente, esse experimento
protecionista terminou em 1976, quando uma junta militar sob o comando de
Jorge Rafael Videla decidiu abrir um
pouco a economia. Obviamente,
acostumadas a décadas de protecionismo,
várias indústrias argentinas sucumbiram perante a concorrência externa o
que ira acontecer por aqui claro já que os
preguiçosos industriais caiapós correm para Brasília solicitando nossos
impostos como forma de proteção, o que fez com que o governo assumisse suas
dívidas. Em paralelo a este setor industrial ineficiente, os gastos
governamentais em total descontrole (financiados pela simples impressão de
dinheiro) e várias medidas populistas de aumentos salariais levaram a uma
crônica inflação de preços, que chegou a 800% ao ano.
Taxa de inflação de preços anual, 1976-1983
Em decorrência desta escalada inflacionária, o governo
Alfonsín criou, em junho de 1985, uma nova moeda, o austral (a primeira moeda argentina que não
tinha o peso em seu nome). Mas a criação
da nova moeda — plano este, aliás, que serviu de inspiração ao Plano Cruzado —
foi feita daquela maneira tipicamente heterodoxa: o governo simplesmente cortou
zeros, congelou preços das tarifas públicas e da cesta básica, e controlou rigidamente
os salários do setor privado. No
primeiro momento, exatamente como também ocorreu com o Plano Cruzado, os preços
ficaram sob controle e a popularidade do governo disparou.
Na melhor fase do plano, a inflação de preços ficou em
"apenas" 50% ao ano. Porém, e obviamente, o governo em
momento algum abriu mão de continuar
imprimindo dinheiro e, assim que os preços começaram a ser descongelados, tudo
voltou a ser como era antes. Para
complicar, como o governo havia contraído
várias dívidas perante o FMI, ele também recorria à impressão de austrais para comprar dólares.
O resultado desta vez não foi apenas uma típica inflação latino-americana, mas sim
uma hiperinflação que chegou a 200% ao mês (julho de 1989) e encerrou o ano
totalizando 5.000%. Quando os preços dos serviços de
utilidade pública dispararam e os argentinos foram para as ruas saquear
supermercados (maio e junho de 1989), Alfonsín renunciou.
A era Menem
Reformas
Eleito para assumir o poder dezembro de 1989, a posse de
Carlos Menem foi antecipada para julho por causa da baderna em que estava o país.
Quando Menem assumiu a
presidência, os gastos públicos estavam em 36% do PIB e o déficit orçamentário
do governo era de 7,6% do PIB.
Em 17 de agosto de 1989, foi aprovada a Ley de Reforma del
Estado, que deu a Menem a autoridade para efetuar várias reformas econômicas
que ajudassem a acabar com a hiperinflação.
As principais reformas foram o descongelamento seguido da liberdade de
preços, a abertura da economia ao comércio internacional, aos investimentos
estrangeiros e ao fluxo de capitais, a reorganização do sistema tributário, a
redução da burocracia e a privatização de várias estatais — a telefônica Entel, a companhia aérea
Aerolíneas Argentinas, vários trechos rodoviários, vários canais de televisão,
algumas redes ferroviárias, a petrolífera YPF (Yacimientos Petrolíferos
Fiscales, cuja privatização só foi completada em 1999), e a empresa de gás
natural Gas del Estado.
Como de praxe nos latinos, várias privatizações foram feitas às pressas — pois o governo estava
desesperado por recursos —, o que gerou vários esquemas de favorecimento,
irregularidades e corrupção.
Após chegar ao insano valor anual de 20.000% em março de 1990, a inflação
terminou o ano em 1.344%
Mas foi em abril de 1991 — sob o comando do ministro da
economia Domingo Cavallo — que a principal e decisiva medida econômica foi
adotada: a reforma monetária que
culminaria na substituição do austral pelo peso. Mas o peso não seria uma nova moeda qualquer:
ele seria inflexivelmente igual a um dólar, valor este irrevogável e fixado por
lei. Esse regime monetário argentino
passou a ser chamado de regime de conversibilidade.
O programa de conversibilidade foi implantado em duas
etapas. Na primeira etapa, em abril de
1991, o Banco Central argentino passou a funcionar como se fosse um Currency Board.
O que vem a ser Currency
Board ?
Para o leigo, o termo soa esquisito, mas realmente não existe
tradução definitiva para o português.
Alguns traduzem como Caixa de
Conversão ou Agência de Conversão; outros traduzem como Conselho da Moeda.
Apesar da ausência de um termo nacional, um Currency Board é
um dos arranjos monetários mais antigos
e tradicionais do mundo, perdendo apenas para o padrão-ouro. Aliás, era comum que o país que adotasse o padrão-ouro o fizesse por meio
de um Currency Board. O Brasil operou um
Currency Board no início do século XX, durante um de nossos efêmeros
experimentos com o padrão-ouro. O
padrão-ouro da Argentina, que durou até 1929, também se deu sob um Currency
Board.
Hong Kong opera um
Currency Board desde 1983. Vários outros
pequenos países utilizam exitosamente um Currency Board, entre eles Lituânia,
Bulgária, Bósnia e Herzegovina, as Ilhas Fakland, Gibraltar e Santa
Helena. A Estônia operou um Currency
Board de 1992 até janeiro de 2011, quando resolveu adotar integralmente o euro.
O princípio de operação de um Currency Board é bastante
simples e, quando obedecido ortodoxamente, muito eficaz. O Currency
Board é o arranjo que se implementa quando se quer adotar uma genuína
"âncora cambial", o que faz com que a moeda de um país se torne um
mero substituto de uma moeda estrangeira.
A única função de um Currency Board é trocar moeda nacional (que ele
próprio emite) por moeda estrangeira, e vice versa, a uma taxa fixa.
No caso específico da Argentina, o Currency Board tinha a função de trocar, sem custo e sem demora, 1 peso
por 1 dólar e 1 dólar por 1 peso. Para
cada dólar que entrasse no país, o Currency Board emitiria um peso argentino em
troca desse dólar. A operação inversa
ocorreria no caso de uma saída de dólar (peso argentino seria entregue ao
Currency Board que, em troca, enviaria o dólar para o destinatário
estrangeiro).
Ao agir assim, a taxa
de câmbio está irremediavelmente fixa.
Se você quisesse vender 1 dólar por um valor maior do que 1 peso para
outra pessoa, esta preferiria simplesmente ir ao Currency Board e lá trocaria 1
peso por 1 dólar. Ou seja, tal artifício
é totalmente eficaz em realmente fixar a taxa de câmbio.
Neste sistema, como a moeda nacional está totalmente atrelada a uma moeda estrangeira, a variação da base
monetária nacional se dá estritamente de acordo com o saldo do balanço de pagamentos
(saldo da quantidade de moeda estrangeira que entra e sai da economia
nacional).
Em sua forma ortodoxa, este
sistema não permite a existência de um Banco Central, pois não deve haver
nenhuma política monetária. Trata-se de
um sistema monetário totalmente passivo, em que a base monetária do país varia
estritamente de acordo com as reservas internacionais.
Sendo assim, dado que
a base monetária do país não pode ser maior do que a quantidade de reservas
internacionais (no caso argentino, o dólar), ela varia de acordo com a
quantidade de moeda estrangeira que entra e sai da economia em decorrência das
transações internacionais do país.
Quando há um superávit nas transações internacionais, a base monetária
doméstica aumenta; quando há um déficit, diminui.
Em tese, como a
quantidade de dólares nas reservas internacionais é, por definição, igual ou
superior à base monetária, é impossível haver qualquer ataque especulativo,
pois seria impossível exaurir as reservas internacionais (a base monetária teria
de ser toda mandada pra fora, algo por definição impossível). Essa é a principal atratividade do sistema:
ele dá segurança aos investidores estrangeiros, que deixam de temer uma súbita
desvalorização da moeda nacional, o que causaria enorme prejuízo para eles
quando fossem repatriar seus lucros.
Outra característica do Currency Board que ajuda a aumentar a confiança do investidor
estrangeiro é o fato de que, ao contrário de um Banco Central convencional, um
Currency Board não pode imprimir dinheiro à vontade; ele só imprime moeda
nacional se receber um valor equivalente em moeda estrangeira. Logo, um Currency Board não pode comprar
ativos nacionais e nem títulos do governo; ele não faz política monetária. Sendo assim, o governo não pode se financiar
por meio da inflação monetária. Isso
obriga o governo a evitar déficits e a manter um orçamento equilibrado (caso
contrário, ele terá de aumentar impostos ou se endividar, o que levaria a um
aumento dos juros em toda a economia).O que esquerdistas
em geral tem pavor
No entanto, ao mesmo tempo em que um Currency Board é extremamente eficiente quando implantando
ortodoxamente, ele cobra severas punições quando seus pré-requisitos
operacionais são desobedecidos. E
foi isso que a Argentina descobriu.
As consequências iniciais
Inicialmente, tanto o Banco Central argentino quanto o
governo seguiram à risca a
ortodoxia. O BC de fato imprimia
dinheiro estritamente de acordo com a variação de reservas internacionais, e o
governo — agora sem poder se utilizar da inflação monetária — reduziu
drasticamente seus déficits.
A inflação de preços, que havia sido de 1.344% em 1990, caiu para 84% em 1991, para 17,5% em 1992, para 7,4% em
1993, para 3,9% em 1994, para 1,6% em 1995 e, de 1996 até o final de 2001, a
média foi de praticamente 0%.
Para um país assim como o Brasil que havia se acostumado a ter uma inflação de preços
média maior do que 250% de 1970 até 1990, e que havia vivenciado valores de até
20.000% em 1990, a queda de preços foi extremamente rápida.
Já o governo conseguiu baixar o gasto público de 35,6% do PIB em 1989 para 27% do PIB em 1995. Igualmente, o déficit fiscal saiu de 7,6% do
PIB em 1989 para 2,3% em 1990 e, de 1991 até o final de 1994, ficou próximo de
0%.
As reservas internacionais, por sua vez, que estavam 3,81 bilhões no final de 1989, foram para
17,93 bilhões ao final de 1994.
O principal efeito desta política de abolição da inflação e de redução do estado foi a perceptível queda
nos índices de pobreza. Em outubro de
1989, o percentual de pessoas abaixo da linha de pobreza em Buenos Aires e
adjacências era de 47,3%. Em maio de
1994, tal valor já havia caído para 16,1%.
A crise do México de dezembro de 1994
As coisas vinham muito bem para a Argentina desde abril de
1991. A economia estava crescendo
robustamente e os preços eram invejavelmente estáveis.
Só que, em dezembro de 1994, a economia do México — cujo Banco Central adotava um sistema cambial
heterodoxo, no qual a cotação do câmbio era diariamente manipulada — sofreu um
ataque especulativo. O governo
desvalorizou subitamente o peso mexicano.
Essa súbita desvalorização gerou pânico nos investidores ao redor de
todo o mundo, os quais, temerosos de terem seus investimentos
desvalorizados, começaram a retirar seus capitais dos países emergentes. (Esse fenômeno ficou conhecido como Efeito
Tequila, e teve repercussões nos países emergentes, especialmente no Brasil.)
A Argentina não ficou imune, e um volume substantivo de
capital estrangeiro foi retirado do país.
O crédito
encareceu. O país entrou em recessão e o
desemprego subiu. A recessão diminuiu as
receitas tributárias do governo; o aumento do desemprego aumentou os gastos
sociais do governo. A consequência
inevitável desta redução na receita e deste aumento nos gastos foi que o
governo voltou a apresentar déficits orçamentários. E estes nunca mais voltariam a ser zero — o
que significa que sua dívida não mais pararia de subir.
O problema do
endividamento é que, quanto maior a dívida, maior o volume gasto com
juros. E quanto mais se gasta com juros,
maior é o déficit fiscal. E quanto maior
o déficit fiscal, maior é a emissão de títulos da dívida para cobrir o déficit,
o que aumenta o endividamento e reinicia o ciclo vicioso.
Não obstante essa
explosão do endividamento do governo, a economia seguia estável e com inflação
zero. Após o susto de 1995, as reservas
internacionais já haviam voltado a subir.
No segundo semestre de 1997,
ocorreu a crise asiática, um tsunami que gerou fuga de capitais ao redor do
mundo e súbitas desvalorizações no baht tailandês, no novo dólar taiwanês,
na rúpia indonésia, no ringgit malaio, no won sul-coreano, no peso filipino e
no dólar cingapuriano. O dólar de Hong
Kong, que opera sob um Currency Board, conseguiu manter sua taxa de câmbio
intacta. A Argentina, nesta crise
específica, sofreu pouco.
Em agosto de 1998, a situação começou a ficar ruim. A
Rússia entrou em crise financeira e o governo russo anunciou uma forte
desvalorização do rublo seguida de uma moratória.
A situação se agrava
em 1999. Com a forte depreciação do real
e de várias outras moedas, as importações de produtos argentinos por estes
países caem. Não bastasse a queda nas
exportações argentinas, os preços dos produtos primários também caem fortemente
no mercado mundial. Como consequência, o
setor exportador argentino encolhe. (No
entanto, ao contrário do que é dito, as importações de produtos estrangeiros
pelos argentinos também diminuem, por causa da recessão. Não foi um aumento nas importações, portanto,
o que atrapalhou as empresas argentinas).
Ricardo López Murphy, economista liberal e honrado formado pela Universidade de
Chicago, é nomeado e imediatamente anuncia seu programa de ajuste fiscal, o
qual seria o melhor de todos: não haveria aumento de impostos, mas sim um
profundo corte de gastos de 2 bilhões de pesos, inclusive para as áreas de
saúde e educação de forma provisória. Haveria também várias
privatizações, inclusive da Casa da Moeda.
Obviamente, o anúncio de medidas tão "drásticas"
gerou forte reação popular. Vários
membros do governo, contrários à nomeação de López Murphy, renunciam em
protesto às suas medidas. Sem apoio,
López Murphy renuncia ao cargo no dia 19 de março, apenas 15 dias após ter sido
nomeado.
Conclusão
Todo o desenrolar dos fatos deixa bem claro de quem é a
culpa. Qual entidade confisca o dinheiro das pessoas, aniquila
toda a sua poupança e até mesmo estipula quantias máximas a serem
utilizadas? Qual entidade gera
incertezas ao se mostrar incapaz de controlar seus gastos e de se adequar
dentro de seu orçamento? O Estado oras, e os latinos ainda acham que quanto mais estado melhor.
Enquanto o governo foi capaz de manter um orçamento equilibrado e de seguir ortodoxamente as regras do
Currency Board, a qualidade de vida da população aumentou substancialmente.
A partir do momento em que o governo não mais conseguiu manter seu orçamento equilibrado (a partir
de 1995) e passou a aumentar sua dívida de forma contínua, gerando incertezas
quanto à capacidade de financiamento e aumentando a propensão a um calote, a
confiança no sistema começou a desaparecer.
Não obstante, tudo poderia ter sido revertido caso o governo houvesse
feito a dolarização da economia em 1999.
Neste cenário, seria por definição impossível uma desvalorização e uma
fuga de capitais.
No entanto, vale enfatizar
o fato de que, não obstante o governo tenha destruído seu orçamento, elevado
seus gastos, incorrido em vultosos déficits, se endividado e, no final, tenha
adulterado os fundamentos básicos do Currency Board, tal sistema deu à
Argentina, um país que há muito desconhecia o que era inflação baixa, um
período de sete anos (1995-2001) de inflação praticamente nula, um atestado de
sua qualidade.
O
tamanho do estrago que um governo é capaz de fazer em uma economia é algo que
jamais deve ser subestimado pela sociedade é um quadro muito semelhante ao que o PT fez com o Brasil.Ricardo Lopez Murphy um liberal argentino honrado e as razões do fracasso do socialismo do século XXI
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